Arquivo do Autor: Orete Nascimento

Tragédia Suburbana

Acordei no meio da madrugada com as vozes de mãe e filha discutindo. Era sempre assim. A filha saía para a balada. A mãe ficava em casa tomando umas cervejas. Quando as duas voltavam a se encontrar, as mágoas represadas durante os dias afloravam. No inicio me preocupava com o desfecho que aquelas brigas poderiam ter, mas me acostumei a voltar a dormir. Soube do acontecido quando saí na varanda e vi um carro de polícia ilhado pela multidão.

Suspeitos

Sexta-feira, quase meia-noite. Desci do ônibus na Leopoldina com meu dinheiro escondido nas meias. Com passadas rápidas, caminhei em direção à Rodoviária. Mesmo com pouca luminosidade na rua, percebi dois homens caminhando rente ao canal em minha direção. Atravessaram para a minha calçada. Atravessei para o outro lado. Voltaram para a calçada do canal. A menos de trinta metros de nosso encontro, me arrisquei entre os carros. Atravessei a rua correndo. Distante, parei para recuperar o fôlego. Olhei para trás. Não havia ninguém.  

Aceno

Caminhei pela praia até me distanciar do último banhista. No mar, um braço se agitava em minha direção. As ondas criavam vales e neles um corpo se distanciava. Não havia mais ninguém além de mim e tudo que eu queria naquele momento era ter aprendido a nadar.

Trinta Segundos

Sinal vermelho. Um carro parou ao lado do meu. Dentro dele, uma mulher esbravejava sem parar. Ela notou que eu a observava e por breves segundos interrompeu sua irritação. O sinal abriu. Ela me concedeu um sorriso acanhado e partiu levando consigo o mistério.

Encontro

De vestido preto, ela caminhou até o canto onde eu me espremia, tentando não ser notado. Os dois sujeitos que estavam comigo deram as mãos e foram ao bar pedir umas cervejas. Minhas mãos suavam e as sequei nas pernas das calças. Ela parou na minha frente e me disse coisas que você precisa saber, mas não terei tempo para contar. Todos já se despediram e o coveiro avisou que devemos partir.

Bala Perdida

Tomava o primeiro gole de café quando os disparos começaram. Se jogou no chão junto com os outros clientes. O barulho dos fuzis vomitando suas balas a esmo castigavam os ouvidos. Do lado de fora, uma mãe gritava para o filho encostado no poste. Ele não pensou nas consequências. Correu até a criança e a escondeu atrás de um carro. Só então reparou em sua camisa manchada de sangue.

Passeio

Quando cheguei, disse bom dia e ela me perguntou de onde a conhecia. Depois, quis saber se tomaria um café comigo, mas me olhou de modo estranho. Então, decidi ser direto e a chamei para almoçar. Concordou, mas comeu quase nada. Insisti em um chá no meio da tarde e a levei a um bistrô. Pediu torta de morangos e tomou um cappuccino. Quando saímos, me convidou para caminhar na beira da praia e conversamos sobre fatos distantes. Ao voltarmos, passamos pelo mesmo bistrô e ela me disse que sentia saudades de comer um pedaço de bolo e tomar um café.

Convite

A mensagem chegou confusa e foi apagada antes que eu a decifrasse. Dias depois a encontrei acompanhada de uma amiga. Me pediu para confirmar presença no seu aniversário. Disse que não sabia. O chefe esperava meu relatório para reunião no dia seguinte. Nos despedimos com cumprimentos formais. Eu havia me distanciado dois passos quando meu nome escapou de sua boca. Me voltei. Ela correu até a mim, disse que a proposta na mensagem ainda estava de pé e se afastou com um sorriso.

Ciladas

PRÓLOGO

Eu sempre soube que minha estupidez terminaria daquele jeito, mas me deixei dominar pela escrotidão que de vez em quando ronda os seres humanos, despertando os seus instintos mais desprezíveis. Naquele momento eu só queria fugir e correr para os braços de Marilza, mas as pernas dormentes, presas àquele cativeiro, não me obedeceriam.

Lembrei-me de que era cristão e católico. Pedi a Deus uma saída em troca de meu arrependimento e muita caridade. Não sei por que me lembrei dos meus filhos e me senti um desnaturado por nunca os colocar em primeiro lugar. Talvez porque estivessem com a vida arrumada. Ambos formados, com bons empregos e mulheres lindas. Embora ainda vivêssemos no mesmo apartamento, nossos horários não combinavam. Estavam sempre saindo ou chegando de algum lugar ou partindo para alguma festa. Com tanta gente morando no mesmo apartamento, família de fato éramos apenas eu, Marilza e Zuleide e, mesmo assim, decidi matar minha sogra, talvez buscando mais solidão.

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